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Isso não é comercial de dia das mães

Camila é uma das minhas poucas amigas que já é mãe. Há uns anos, quando ela ainda morava na Nova Zelândia, escreveu contando "estou grávida", inesperadamente.

A Cá já apareceu na newsletter e já apareceu aqui no blog como "Comentarista". Agora faz participação com um texto sensível e sincero, assim como é ela, cheia de dúvidas e de magia. Obrigada pelo texto, Cá <3

A foto é de Lisa Sorgini, fotógrafa australiana que retrata as experiências do cuidado e das relações maternas, buscando investigar percepções e construções sociais em torno do conceito de família e principalmente do papel de mãe.

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Gastei um tempo tentando encontrar um tema para escrever aqui.

Como falar sobre maternidade para um público majoritariamente sem filhos - eu imagino - sem ser piegas, cansativa e desinteressante?

Eu poderia dizer como é um parto natural sem anestesia de maneira bem crua - cheia de mágica e desagradáveis exames de toque, mas isso poderia assustar algumas pessoas. Talvez falar como as mães estão cansadas e sobrecarregas, mas seria chover no molhado. E falar sobre o amor das mães pelos filhos seria irresponsabilidade, laços biológicos não garantem afeto.

Então vamos falar sobre as propagandas de Dia das Mães, o que realmente acham delas?
Não quero ser grosseira, uma mãe é todo esse papo furado dos comerciais da Boticário, somos realmente capazes de mover um mundo inteiro, mas acho - particularmente - um desserviço.

Essa imagem de perfeição e força é opressora e só aumenta a fatia de culpa que sentimos mediante qualquer pequena fissura na expectativa que temos sobre nosso próprio maternar.

"O exemplo vem de berço", "seus filhos vão aprender pelo exemplo".
E o exemplo que precisamos ser é esse dos comerciais de Dia das Mães?
Bom, aqui tem uma verdade: qualquer mãe pode ser uma cuzona e nós somos mesmo.

Não podemos ser um exemplo de pessoa normal, que ama, que erra e que faz o melhor que pode no meio do caos que é viver? Será que esse estereótipo de mãe divina não nos afasta de nossos filhos quando eles passam a ter qualquer entendimento sobre a vida? Como estar à altura de uma mãe ou pior da sua mãe
Quanta carga emocional gratuita de todos os lados.

Então aqui vai dose real de uma mãe real, eu:

Eu sou a mãe que deixou a filha cair da cama aos sete meses.
Que já gritou com ela.
Que já mandou ela parar de chorar.
Que já disse que iria embora e deixar ela lá.
Que puxou ela pelo braço forçando-a a pôr a roupa.
Eu sou a mãe que em determinados dias só quer mandar a criança para a casa dos avós.
A mãe que quase sempre não sabe o que fazer, não sabe o que dizer e não sabe como resolver crises.
E que não aguenta mais ler ou assistir histórias infantis.
Eu sou a mãe que tem vontade de desistir e tomar atalhos só para tornar minha vida mais fácil.

E veja você, também sou a mãe que pediu desculpas todas as vezes que gritou.
Que se escondeu atrás da porta em um dia difícil para chorar e respirar, só para não gritar mais.
Sou aquela que se penalizou de arrependimento por puxá-la pelo braço.
Sou a mãe que tem culpa o tempo todo porque não sou a mãe perfeita, porque não existe receita para como criar um filho, mas que inventa milhares de maneiras de ter tempo de qualidade com a filha.
E sou a mãe que passa noites em claro fazendo inalação, que planeja e executa todos os pequenos detalhes da vida da filha, que planeja aniversários, que pensa nela antes de tomar qualquer decisão e que presa pela segurança, saúde e bem-estar dela.
Sou a mãe que acolhe, que cria e que ama incondicionalmente.

Mas prefiro ser lembrada pela parte ruim.
Porque no fim o que merecemos não é parabéns por sermos perfeitas.
E sim parabéns por não desistirmos.