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Cartas de amor, introdução

Tudo uma correria ultimamente. Mudança de país, casa nova, casamento, quartinho do bebê, mala de maternidade, consultas pré-natal, tâmaras e abacaxi, ler Winnicott, trabalho CLT, um terror chamado enxoval (ter que comprar roupas do zero para um ser humano é sacanagem, além de todo um universo de aparatos. É coisa demais). Muito pra pensar e decidir.

No meio de toda essa avalanche gostaria de deixar registrado aqui algo que aconteceu mês passado. Dani e eu celebramos o nosso casamento no dia 20 de julho em um evento pequeno, simples, e cercados de amigos queridos e família, com música ao vivo e comida brasileira. Nada de cerimônia formal. Ao invés disso convidamos algumas pessoas que nos acompanham de perto para falar brevemente sobre nós, sobre amor, sobre o que une e mantem as pessoas. Cartas de amor.

Foram três discursos belíssimos (e uma surpresa). Lud falou sobre o papel do acaso e o protagonismo da escolha em uma relação, Dudu discorreu sobre as necessidades de um relacionamento e o que fica com a passagem do tempo, o pai do Dani (que também se chama Daniel) sobre o amor sob a ótica de sua religião. Abaixo, algumas fotos do talentosíssimo Ayá @memoriaparameupovo que fez os registros documentais desse dia especial.

A mudança e o berço

A varanda do Fitó

De mãos dadas, Lud e eu.


Pastelzinho na mão, ouvindo cartas de amor

O sorriso do Dudu

Abraços, abraços

Pra não ficar muito longo, e liberar aos pouquinhos, a história continua nos próximos posts. Stay tuned :)

Cadeiras dinamarquesas

A última viagem-de-fim-de-semana dessa temporada em Amsterdam foi Copenhagen. Estou lendo a Trilogia de Copenhagen de Tove Ditlevsen, e talvez por isso esse estalo para conhecer a cidade. Começamos o sábado no Jardim Botânico, ótima recomendação de Dudu, depois almoço e seguimos para o museu de design dinamarquês. Gostamos muito da experiência, e eu particularmente, gostei de como é estruturado (considerando as exposições atuais): moda, tecnologia, tecidos, utilitários, e por fim cadeiras, seguido de outros móveis modernistas.

O túnel de cadeiras reúne 125 itens, de maioria modernista e dinamarquesa, mas também de designers internacionais (americanos, italianos, ingleses) que influenciaram e foram influenciados pela criação local. E no fim, uma sala onde você pode se sentar em algumas dessas cadeiras. Maior delícia!

Ainda para se atualizar sobre o que está rolando na contemporaneidade, vale um passeio a pé pelas redondezas do museu. Existem centenas de lojas de design e ateliês de arte pela cidade. Ruas com casinhas coloridas e paredes com roseiras, o maior charme <3

Aqui no Brasil, gosto muito do design de cadeiras de Lina Bo Bardi, queria duas girafas na minha casa. Um dia quem sabe? Mas fora ela, não conheço outros nomes.

Bowl Chair de Lina


E vocês? Algum designer de cadeiras brasileiro para indicar?

cartas para Bento, por Júlia Lyra

Conheci a Júlia através do Lucca, nos encontramos ano passado em sua casa em Lisboa, quando Bento já estava quase pra nascer. Hoje, nesse dia das mães, tenho a honra de compartilhar os textos dela, que incluem relatos sinceros sobre a experiência de maternar: dúvidas, anseios, alegrias, surpresas, além de registros e recados cheios de afeto para seu filho. Escrever para não esquecer, e escrever para o futuro. Júlia, obrigada por compartilhar o que sente com tanta sensibilidade e candura. Feliz dia das mães para nossas leitoras queridas!

-- cartas para Bento
Quando você ainda se formava fisicamente em mim, eu tentava formar em mim a ideia de que você já estava ali e logo mais estaria aqui. Tentava conceber uma imagem de você, do seu rosto, do seu jeito ou de como seria a vida com a sua chegada, buscando de alguma maneira dar forma a esse acontecimento que tinha lugar dentro de mim. Era difícil acreditar no que vivia, processar as mudanças e ainda me preparar para você. Eu nunca fui boa com registros em geral, mas no impulso comecei a tentar conversar com você em um caderno velho que achei em casa. Hoje, dez meses depois da sua chegada, me vejo e te vejo em cada palavra, em cada momento distinto, e apesar de ser ainda muito pouco perto de tudo que já vivemos, me permite enxergar como temos aprendido juntos a re-existir no mundo, eu mãe e você Bento.

um dia antes:
Acordei hoje, um domingo, com cólicas leves. Dizem que pode ser o primeiro sinal dos pródromos ou do próprio trabalho de parto, que pode perdurar por dias. É maluco pensar que qualquer dia pode ser o último dia das nossas vidas sem você. Independente do que isso signifique, em breve você chegará e passaremos juntos por essa travessia que te trará ao mundo e nos tornará, pra sempre, mãe e filho. Eu poderia te dizer várias coisas agora, mas a verdade é que está sendo um dia de domingo comum – seu pai jogando, eu no quarto e vovó fazendo o almoço – que poderá se tornar o dia mais importante de nossas vidas.

dia 6:
Seis dias atrás você chegou ao mundo. Eram 19:24h quando te peguei no colo pela primeira vez. Não conseguia acreditar que depois de meses de espera e 24h de trabalho de parto, estava ali olhando pra você. Nada me preparou para viver aquilo e tudo o que viria a seguir e qualquer coisa que eu escreva vai parecer exagero. Olhava pra cada detalhe do seu corpo tentando eternizar aquilo que via e sentia, tentando assimilar aquele ser tão perfeito em cada característica, tentando processar aquele amor que nascia com o seu nascimento. Com você, nasceram também os medos de uma mãe recém-nascida e nasceu, sobretudo, um amor incondicional que ainda não sei administrar. E que alegria enorme é poder te ver existir em cada detalhe, te ver crescer, te cuidar… dizem que você precisa de mim, mas sou eu que preciso de você. Bem-vindo ao mundo, filho.

dia 14:
Hoje você completa duas semanas de vida. Dias atrás eu não fazia ideia de como sua existência iria me transformar tão intensamente. Choro constantemente porque te amar assim me tira o chão e me preenche de medo, muito medo. Os primeiros dez dias foram os mais desafiadores da minha vida e aos poucos venho pegando um pouco de fôlego, mas ainda me sinto perdida nessa jornada de existir após a sua chegada. Parece que estou longe de mim, perdida no horizonte, ainda que imersa em uma felicidade abundante que é te ter na minha vida. Vivo sentimentos antagônicos em frações de segundos. Sinto ciúmes de você por te sentir tão meu, por querer tanto ser teu colo e te proteger do mundo, mas acho que aos poucos vamos nos encontrando em nós, cada um na sua individualidade. Por enquanto, ainda somos juntos, você sendo uma parte de mim fora de mim e eu sendo, pra você, você mesmo. Não sabemos ainda existir sem ser assim, coladinhos, e quero conseguir aproveitar a delícia de te ter tão perto. Você, tão pequenino, ocupa esse lugar tão imenso em mim que custo acreditar que te mereço e, por isso, me culpo por cada detalhe que sinto falhar mesmo tentando com todo o meu ser te dar o meu melhor. Enquanto aprendo a ser mãe, te observo lentamente para registrar o sentimento dessa fase e para que, na confusão de te cuidar, eu não esqueça de como foi te descobrir aos poucos.

mês 5:
Hoje é o último dia do ano que você nasceu. Nesse ano, você aprendeu a sorrir, a fazer bolhinhas com a boca, a pegar objetos com a mão, aprendeu a gargalhar, produziu as primeiras lágrimas, balbuciou os primeiros sons, viajou de avião e de carro, conheceu a praia… são apenas algumas das incontáveis primeiras vezes que você viveu e ainda vai vivenciar. Me sinto privilegiada pela oportunidade de presenciar tudo isso de perto, de ter sido colo, alimento, companhia, carinho e segurança pra você. Hoje, depois de algum tempo, consegui chorar. Chorei de alegria ao visualizar sua vida, ao ver beleza nos momentos que vivemos e ainda vamos viver juntos. Independente da data, tem coisa que não posso me esquecer. Preciso lembrar de você, me lembrar de nós, me lembrar, por exemplo, do seu sorriso de um único dente, do seu jeito de me acariciar enquanto mama, ou ainda do som da sua gargalhada e da sua carinha amassada, assanhada e sorridente ao acordar. Não posso esquecer dos barulhinhos que você emite quando acorda naturalmente ou dos seus gritinhos agudos de empolgação. Não posso esquecer nada disso porque você está e sempre estará aprendendo a existir, a ser você no mundo e cada fase será única em si. Não quero esquecer de nenhuma delas.

mês 8:
Não fazia ideia antes de ser mãe do que um bebê é capaz de fazer, mas me surpreendo com o avanço das suas habilidades, sobretudo com a facilidade com que manuseia os objetos e aprende novas formas de usar o próprio corpo. Acho fascinante a sua curiosidade com o mundo, seu jeito de observar atentamente cada ambiente procurando algo novo e sua capacidade criativa de explorar uma mesma coisa de formas diferentes. Me deparo quase sempre com a ideia que você ainda está conhecendo o mundo e as coisas, formando suas primeiras concepções de tudo, e deve ser por isso que tem pressa de andar. Diferente de antes, que recebia passivo os comandos, agora já demonstra suas vontades, preferências, o que gosta ou o que rejeita. Não tenho conseguido te escrever como gostaria, pois como deve imaginar, são muitas as demandas do dia-a-dia e o tempo disponível para mim é curto, mas o fato é que tem sido cada dia mais leve e divertido à medida em que vamos, eu e você, nos tornando mais autônomos e confiantes um no outro. Vamos, aos poucos, nos acostumando a sermos também sós, apesar de sermos sempre juntos, pra sempre.

mês 9:
Hoje você engatinhou pela primeira vez de um jeito bem desengonçado. Nesses momentos, me deparo com o passar do tempo, sentindo nas suas novas descobertas e aprendizados o seu crescimento. Você vai mudando e eu vou observando os detalhes desse movimento, da sua vida acontecendo, da sua personalidade se formando, do seu rosto mudando… para mim, é tudo tão rápido e demorado. Como dizem, “os dias são longos e os anos são curtos”. Claro que você continua dando bastante trabalho, afinal crescer e descobrir o mundo deve ser empolgante, né filho? A mãe te entende, mesmo que nem sempre transpareça. É que são tantas coisas que eu também tô aprendendo, apesar de talvez você achar que eu já sei de tudo. Tenho aprendido que os dias agora tem um tempo diferente, próprio de você, com um relógio que muda de acordo com o seu desejo. Há dias e horários mais longos, a depender se você está feliz, cansado, agitado… quando seus dias estão difíceis, difícil é também pra mim lidar com sua insatisfação. No meu anseio de te ver bem, ainda estou aprendendo a acolher suas dores sem doer tanto em mim. É difícil e dói, mas acompanhar você crescer é lindo demais. É que você é parte de mim, filho, e que bom que escolhi viver o difícil. Já não sou mais sem você, já não sou mais sem ser sua mãe… E enquanto terminava de escrever, você acordou. Hora de voltar pra você.

Aquarela e desenho de @clairesahara

Nove dias na Islândia

Poderia ter feito fotos melhores se minhas mãos não estivessem congelando. Tiradas com X100F, pra não esquecer essas paisagens de tirar o fôlego.

No toca-discos de Lorena

Em fevereiro li, e adorei, "As Meninas" de Lygia Fagundes Telles. Fiz esse post no IG com meus grifos preferidos e deixo aqui a playlist composta por alguns dos artistas tocados na vitrola de Lorena, uma das personagens centrais da história. Tem música clássica, Jimmi Hendrix, Bethânia e Gal. Recomendo playlist e livro!

More than this, Roma

Sábado à noite em Roma antes do jantar, com a cidade já escura mas movimentada e enérgica, escuto vindo de longe "More than this" de Roxy Music. Senti, instantaneamente, uma grande satisfação (como quando falo pra mim mesma, em pensamento, "ownn amo essa música" ainda tentando reconhecer o nome e artista). Pra mim transmite uma mistura inseparável de melancolia com alegria tímida, que quer fugir do peito mas não encontra espaço. Ainda assim, dançante.

Claramente a primeira associação é com a cena do karaokê de Lost In Translation, em que Bill Muray canta essa música de um jeito desafinado, devagar, e nem aí pra impressionar.

A falta de ansiedade e expectativas naquele momento é um deleite. Tão quanto a personagem de Scarlett Johansson dizendo, sem hesitar, que ainda não descobriu o que fazer da vida.

Deu vontade de assistir de novo o filme inteiro, com tantas nuances e delicadezas. Deu saudade de Tóquio, mas confesso que a música também combina muito com essa Roma que visitei em um fim semana, ou com essa fase atual da vida. Meio atemporal, desconfio.

Pra mim Sofia Coppola transmite e normaliza essa sensação um tanto coletiva, de que estamos perdidos na vida, o tempo todo carregando incertezas em relação às nossas escolhas, identidade, lugar no mundo, até não precisar mais carregar. E ainda traz a esperança de um lugar livre da necessidade de impressionar ou ser impressionado o tempo todo. Só viver junto, compartilhar experiências singelas, e celebrar e proteger os grandes encontros, exaltando a misteriosidade que só pode ser vista de dentro.